Investigação tinha por base gra
vações de delator, entre as quais a que Jucá fala em ‘estancar sangria’ provocada pela Lava Jato. Para PF, eventual intenção de barrar operação não configura crime.

Por Mariana Oliveira, TV Globo, Brasília

Relatório da PF não vê obstrução da Lava Jata por Renan, Jucá e Sarney

A Polícia Federal enviou nesta sexta-feira (21) ao Supremo Tribunal Federal relatório conclusivo da investigação sobre suposta tentativa de obstrução da Operação Lava Jato pelos senadores Renan Calheiros (PMDB-AL), Romero Jucá (PMDB-RR) e pelo ex-senador e ex-presidente da República José Sarney (PMDB-AP).

No relatório, de 59 páginas, assinado pela delegada Graziele Machado da Costa e Silva, a Polícia Federal conclui que não houve crime de obstrução. Para a PF, a eventual intenção não pode ser considerada crime, e, portanto, os políticos não cometeram atos de obstrução da Justiça.

A PF avaliou gravações de diálogos feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, delator da Operação Lava Jato. Numa das conversas, com Romero Jucá, o senador sugere a mudança do governo a fim de viabilizar um pacto para “estancar a sangria” representada pela Lava Jato.

O inquérito foi aberto pelo ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com base na delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.

“Não compreendemos existir elementos indiciários de materialidade do crime (…) haja vista que no espectro cognitivo próprio desta sede indiciaria, o conteúdo dos diálogos gravados e a atividade parlamentar dos envolvidos ou no período em comento não nos pareceu configurar as condutas típicas de impedir ou embaraçar as investigações decorrentes da Lava Jato”, diz o texto do relatório.

Da esq. para a dir.: Rena Calheiros, Romero Jucá e José Sarney (Foto: Wilson Dias/Agência Brasil; Marcelo Camargo/Agência Brasil )

Arquivamento ou denúncia

Agora, o ministro Fachin vai encaminhar o relatório conclusivo da PF à Procuradoria Geral da República.

O procurador Rodrigo Janot poderá concordar com a PF e pedir o arquivamento do caso ou poderá discordar e denunciar os políticos mesmo assim.

Não há prazo para isso ocorrer, mas o caso só deverá ter andamento após o recesso do Judiciário, que termina no começo de agosto.

Janot pediu a investigação por entender que houve tentativa de comprometer a operação, em razão de fatos revelados na delação premiada de Sérgio Machado, que gravou conversas com os políticos.

‘Pacto’ contra a Lava Jato

Numa das gravações, Jucá sugere um “pacto” para barrar a Lava Jato. Mas, segundo a PF, as conversas não passaram de “meras cogitações”.

“As conversas estabelecidas entre Sérgio Machado e seus interlocutores, limitaram-se à esfera pré-executória, ou seja, não passaram de meras cogitações. Logo, as condutas evidenciadas não atingem, numa concepção exclusivamente criminal, o estágio de desvalor necessário à perfectibilizacao do delito em questão, que não prescinde, ao menos, de lesividade potencial”, diz o relatório.

Em outro ponto do documento, a delegada diz que a intenção de obstruir não basta para caracterizar um crime.

“Outro cuidado a ser percebido é que o simples desejo, intenção ou manifesta vontade de impossibilitar a execução ou o prosseguimento da investigação em realizado a organização criminosa, críticas, reclamações ou desabafos feitos a condição de determinada investigação, aos agentes investigadores e ou mesmo ao juiz, não bastam para caracterização do crime.”

Acordo de delação

O acordo de delação de Sérgio Machado foi assinado em maio do ano passado e homologado pelo então relator da Lava Jato, Teori Zavascki.

Com base nessa delação, Janot chegou a pedir a prisão de Jucá e Renan por obstrução de Justiça, mas o pedido foi negado pelo ministro do Supremo, que morreu num acidente de avião no começo deste ano.

O acordo de delação prevê que, caso seja condenado, a pena máxima de Machado será de 20 anos de prisão e que ele ficará primeiramente por 2 anos e 3 meses em regime fechado domiciliar com tornozeleira eletrônica, depois mais 9 meses em regime semiaberto devendo se recolher à noite, feriados e finais de semana, serviços à comunidade e pagamento de multa de R$ 75 milhões à Transpetro.

Machado não começou a cumprir a pena prevista no acordo, que é o benefício concedido a ele pelo Ministério Público, porque não foi condenado. Ele está atualmente em liberdade.

Machado já pagou R$ 56 milhões da multa prevista de R$ 75 milhões. Na semana passada, a defesa informou ao STF que ele pagará os outros R$ 19 milhões até 24 de novembro deste ano, como previsto no acordo.

Colaboração ‘ineficaz’

De acordo com o relatório, a PF entendeu que a colaboração de Sérgio Machado se mostrou ineficaz e, por isso, diz que o ex-presidente da Transpetro não é merecedor dos benefícios previstos na lei.

“A colaboração que embasou o presente pedido de instauração mostrou-se ineficaz, não apenas quanto à demonstração da existência dos crimes ventilados, bem como quanto aos próprios meios de prova ofertados, resumidos estes a diálogos gravados nos quais é presente o caráter instigador do colaborador quanto às falas que ora se incriminam, razão pela qual entende-se, desde a perspectiva da investigação criminal promovida pela Polícia Federal, não ser o colaborador merecedor, in casu, de benefícios processuais”, afirma a delegada.

Versões dos envolvidos

Veja abaixo o que disseram as defesas dos peemedebistas:

Renan Calheiros: “Foi uma decisão justa para mostrar que réus confessos e desesperados pela redução das penas não podem simplesmente acusar sem provas. Tive a intimidade violada por essas gravações armadas para tentar me incriminar. Saber que não conseguiram é um alento em meio a essa onda de denuncismo de bandidos”, afirmou por meio de nota a assessoria do parlamentar.
Romero Jucá: Por telefone, o advogado do senador Romero Jucá e do ex-presidente José Sarney disse que o trabalho da Polícia Federal foi muito bem feito e chegou à conclusão a qual eles defendiam desde o início. Disse ainda que espera que Sérgio Machado perca os benefícios da delação e que, tendo em vista o posicionamento da PF, espera o arquivamento do caso por parte do Ministério Público.
José Sarney: Por telefone, o advogado do ex-presidente José Sarney e do senador Romero Jucá disse que o trabalho da Polícia Federal foi muito bem feito e chegou à conclusão a qual eles defendiam desde o início. Disse ainda que espera que Sérgio Machado perca os benefícios da delação e que, tendo em vista o posicionamento da PF, espera o arquivamento do caso por parte do Ministério Público.