Leis que exigem transparência dos gestores públicos já existem há alguns anos no Brasil, mas ainda não é possível dizer que elas pegaram. Pelo menos quando se trata de prefeituras e câmaras municipais. Levantamento feito pela Consultoria em Administração Municipal (Conam) — empresa que presta assessoria para cerca de 100 municípios — e complementado pelo GLOBO mostra que procuradores e promotores já entraram com ações contra pelo menos 44 prefeituras e 16 câmaras. O objetivo é obrigá-las a se adequarem à lei.
O número ainda é modesto, diante dos 5568 municípios que há no país, mas deverá crescer em 1º de junho de 2016. Nessa data, o Ministério Público Federal (MPF) pretende ajuizar várias ações contra quem ainda não estiver cumprindo as regras de transparência. De olho no descumprimento da lei, integrantes do Ministério Público vêm tentando obrigar os municípios a mudar sua postura. Primeiro por vias extrajudiciais, enviando, por exemplo, recomendações ou firmando acordos. Depois, quando isso não dá certo, entrando na justiça com ações que podem resultar até mesmo no afastamento do cargo e na suspensão dos direitos políticos de prefeitos e presidentes de Câmaras Municipais.
Os gestores citam vários motivos para não cumprir a lei. A falta de pessoal capacitado, prazo exíguo, secretários que não cumprem ordens e até desconhecimento da lei são algumas das razões alegadas. Responsável por monitorar o cumprimento da Lei de Acesso à Informação em Goiás, o promotor Rodrigo Bolleli destaca duas questões que entende serem preponderantes.
— Infelizmente, ainda permeiam os municípios a cultura do sigilo. Ainda relutam em divulgar as informações, porque permeia acima de tudo a cultura do sigilo. Os prefeitos, os gestores acham que não devem divulgar informações. Essa inicialmente é nossa maior resistência. Mas a gente nota também a falta de capacidade técnica. Muitos municípios de desenvolver o programa para implementar efetivamente os portais. Primeiro a cultura de sigilo, depois a falta de pessoal capacitado para gerir os portais — diz Bolleli, que é coordenador do Centro de Apoio Operacional do Patrimônio Público do Ministério Público de Goiás (MPGO).
A advogada Giselle Gomes Bezerra, consultora jurídica da Conam, diz que ainda há uma questão cultural contra a transparência, mas lembra que o princípio da publicidade já estava previsto na Constituição de 1988.
— A questão cultural ainda pesa sim, sem sombra de dúvida. Mas acho que hoje não podemos nos apegar à questão cultural, porque transparência está em voga. E o princípio da publicidade sempre esteve presente — diz Giselle.
A Lei da Transparência, de 2009, dava quatro anos para que os municípios de até 50 mil habitantes passassem a ter um portal na internet em tempo real com informações sobre receitas e despesas. Para as cidades maiores, o prazo era menor. Em 2011, foi aprovada a Lei de Acesso à Informação, permitindo que qualquer cidadão pudesse encaminhar um pedido de informação aos órgãos públicos. Mas nem todos parecem observar as normas. Outros só fizeram isso depois de acordos com o Ministério Público. Houve quem se mexesse apenas depois de uma ação na justiça. E há até quem deixou de cumprir decisão judicial determinando a adequação às regras de transparência.
Ministério Público estadual porque existem recursos próprios do município. Em relação ao MPF, se justifica porque, apesar de a União ter um grau de transparência muito bom, o problema é que esse recurso federal, quando entra no estado ou município, entra numa caixa preta — diz Eduardo El Hage.

CÂMARAS MUNICIPAIS

Os prefeitos são, neste momento, os grandes alvos do Ministério Público quanto ao cumprimento das leis que determinam a transparência no trato com as informações públicas. Mas elas valem para todos, como algumas Câmaras Municipais já começam a perceber. O levantamento feito pela empresa Consultoria em Administração Municipal (Conam) e complementado pelo GLOBO localizou 16 ações ajuizadas contra o Legislativo Municipal.
a Enccla já firmou que um de seus eixos vai ser trabalhar na transparência do Legislativo Municipal — diz Eduardo El Hage, procurador da República em São João de Meriti (RJ) e gerente do projeto “Ranking Nacional dos Portais da Transparência” do Ministério Público Federal (MPF), acrescentando que a tarefa de fiscalizar o Legislativo municipal é do Ministério Público estadual, uma vez que as Câmaras Municipais, ao contrário das prefeituras, não recebem recursos federais.
O ranking do MPF, divulgado em dezembro de 2015, avaliou a transparência de todas as prefeituras brasileiras. No caso das Câmaras Municipais, não há uma levantamento nacional. Uma exceção é o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP), que avaliou o Legislativo de 636 dos 645 municípios paulistas. Apenas Várzea Paulista tirou 10 e somente 205 Câmaras — cerca de um terço — ganharam nota 5 ou mais. A Câmara Municipal da capital paulista cravou 7,1.
O Ministério Público do Paraná (MPPR) também ajuizou ações contra seis câmaras municipais do estado. Em Santa Catarina, são cinco câmaras. No Maranhão, há uma ação do Ministério Público estadual. Há também mais um caso em Mato Grosso e outro no Pará.